segunda-feira, 20 de abril de 2009

O país da moral e dos bons costumes

Tem dias em que eu acordo e tenho certeza de que estou na Europa. Todo mundo tem educação, segurança, saúde. As ruas são relativamente limpas e não se vê gente morando nelas. Quase acho que estou no Velho Mundo, com velhos hábitos, tradições e pudores. O Brasil, país do Carnaval e do futebol, virou a sede da moral e dos bons costumes.

A gente vê mulher de sutiã no meio do estádio e acha normal. Vê gente com “tapa-sexo” que não tapa nada, e curte à beça. Vê funcionários do metrô espancando as pessoas, e faz parte. A gente vê cada vez mais crianças sendo vítimas de violência sexual. Vê tiroteio, bala perdida, gente inocente morrendo. Mas a gente está preocupado mesmo é com o dedo que o Cristian levantou na comemoração do gol contra o São Paulo, porque isso, sim, afeta profundamente nossa vida, nossos valores e nossas crenças.

E no país da impunidade, em que convivemos com bandidos, estupradores e assassinos nas ruas, um inquérito policial foi aberto para apurar as responsabilidades pelo tão polêmico dedo do meio do jogador. No país em que NENHUM estádio de futebol oferece segurança, o Ministério Público acha que é de grande importância acusar um atleta e seu dedo e, quem sabe?, mandá-lo à prisão por prazo que vai de 15 dias a seis meses.

É a Europa, só pode. Ou Pegadinha do João Kléber.

O São Paulo reclamar eu até entendo, afinal é para isso mesmo que JJ veio cair neste mundo de meu Deus. Está fazendo a parte dele em tumultuar, reclamar do estádio, da purpurina, da torcida e, claro, do dedo do Cristian. Cada um defende seus interesses, ainda mais em se tratando de futebol. Tudo dentro da normalidade. Não podemos esperar nada além de uma denúncia no Tribunal de Justiça Desportiva, que vai apurar e ver se considera a atitude do atleta anti-esportiva (ou sei lá que termo se usa para esse tipo de “violação”).

Agora, calma lá. Uma atitude que vai contra o espírito esportivo não necessariamente configura crime. Tem cara que sai sangrando de campo, com a cara inchada, a perna quebrada, o supercílio aberto, e alguém está se preocupando em mandar o agressor para a cadeia? Não! Por quê? Porque faz parte do jogo, minha gente! O zagueiro quebrar a perna do atacante pode ser (como é, claro) uma atitude anti-esportiva, contra o “fair play” (que, sejamos bem francos, nem existe no Brasil), mas faz parte, sim, do esporte. E disso todo mundo sabe! O agressor, o agredido (que ainda chega na entrevista coletiva depois do jogo e diz que não viu maldade no ato do companheiro!), a torcida, o dirigente. E o Ministério Público!

O mesmo raciocínio serve para a atitude de Cristian durante a comemoração do gol do Timão contra o SP no último domingo. Antes de tudo, temos que considerar o contexto da partida: clássico, semifinal, precisamos da vitória, faltam segundos para acabar o jogo… E O GOL!!! É momento de explosão, de catarse, de festa!!! Mas não, vivemos na Europa e aqui não se faz festa. Não se pode tirar a camisa, não pode pendurar no alambrado, não pode mostrar o dedo.

É futebol, minha gente, é a diversão do povo! Na arquibancada está todo mundo xingando a mãe do árbitro, o jogador rival, amaldiçoando o técnico. E isso não significa que de fato odiemos a mãe do árbitro nem o jogador rival (às vezes) nem muito menos nosso técnico (pelo menos não atualmente), significa? A gente xinga porco, bambi, sardinha, mas todos temos amigos torcedores de SP, Palmeiras e Santos. É puramente paixão futebolística! É amor, é desespero, é alegria imensa do futebol. Sensações que qualquer pessoa sabe: não agridem ninguém verdadeiramente.

Que fique claro: não estou pregando o ódio entre torcidas nem agressões de qualquer tipo, sou completamente contra tudo isso e no que dependesse de mim todo mundo ia para o estádio livre, sem escolta de polícia, cantando feliz. Sei que o jogador precisa ter responsabilidade para não incitar ainda mais a violência e despertar a agressividade que já vive dentro de muitos coraçõezinhos na arquibancada. E entendo também que pode não ser um bom exemplo mostrar o dedo em rede nacional.

Mas Cristian -que aliás nem foi o primeiro a fazer esse gesto em campo, no Brasil, e está sendo usado como exemplo- já pediu desculpas, se explicou publicamente, se justificou aos cidadãos de bem do país… Não é o caso de inquérito policial nem de cadeia. Não percamos a noção nem a medida, por favor. Temos problemas mais graves a resolver. Aqui não é Europa.

Copa do Brasil hoje. Precisamos daqueles dois básicos.
Vai para cima, Timão!

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